FFXIV | Contos da Dragonsong War: Uma légua em seus sapatos

Tales from the Dragonsong War: A Malm in Her Shoes
Contos da Dragonsong War: Uma légua em seus sapatos

Leveilleur. Alisaie tinha um orgulho imenso de seu nome. Ele servia como um lembrete constante ao mundo da conexão com seu avô, o grande Louisoix Leveilleur–o homem que poupou o continente de Eorzea das piores devastações da Sétima Calamidade Umbral. Não é preciso dizer que tal herança nobre trazia certas expectativas e ela havia trabalhado incansavelmente em Studium para as superar. Apesar de muitas realizações acadêmicas louváveis, o jeito moleca e língua afiada–treinada durante anos brigando com o seu irmão gêmeo igualmente talentoso–trouxeram-na o desprezo de seus colegas. Mas Alisaie se consolava com o pensamento de que o próprio Louisoix tinha uma veia travessa e nunca tolerava tolos de maneira conivente.

Tendo completado seus estudos, Alisaie viajou para Eorzea em uma febre de expectativa, ansiosa para ver o continente pelo qual seu avô tanto sacrificou. Porém o que encontrou lá não foi nada como o imaginado. E então, após muita reflexão, decidiu explorar a terra em busca de uma causa pela qual lutar–um propósito próprio. Viajaria sozinha, acompanhada nem por servos nem aventureiros–e certamente nem pelo seu irmão–convencida de que as impressões a serem formadas não fossem imaculadas por opiniões de outros.

E agora, após muitos dias na estrada, ela se encontrava nas terras áridas de Thanalan. Tendo lutado por quilômetros contra o calor implacável do meio-dia, cedeu e buscou refúgio em uma taverna à beira da estrada.

“Vadia teimosa!”

Ela apertou os olhos em direção à origem da confusão, olhos ainda não acostumados com a luz fraca ambiente, e distinguiu um homem corpulento erguendo-se para cima de uma jovem garota. A garota–uma viajante, a julgar pela vestimenta–não se intimidou, mesmo quando o brutamontes erguia o punho pesado.

Alisaie suspirou. Ela tinha se cansado dessas pessoas bárbaras e suas briguinhas infantis, mas não se esquecera da velha advertência de seu avô: “Ignorar o apelo daqueles que se poderia salvar não é sabedoria–é indolência.”

“Está quente demais para lutar,” Alisaie anunciou em voz alta. “Mas se você insiste em bater em algo, ficaria feliz em marcar um encontro entre você e o piso.”

Ambos hesitaram ao som da voz de Alisaie, voltando-se em sua direção para encontrar um olhar frio com suas expressões quase idênticas de surpresa atordoada.

 

E assim Alisaie conheceu a jovem Emery, a comerciante viajante.

 


De acordo com Emery, sua caravana era normalmente acompanhada por um guarda, mas depois que o dito mercenário inesperadamente recusou a oferta de um novo contrato, ela foi deixada à mercê de um cliente que pensou em a intimidar para aceitar uma oferta menos favorável. Tendo testemunhado o quão facilmente Alisaie intimidou o homem, no entanto, a comerciante agora parecia determinada a convencer sua salvadora a servir como a nova escolta da caravana.

Como todos os viajantes ambulantes, explicou Emery, seus associados ganhavam a vida negociando mercadorias entre povoados distantes. Mas, afirmou, os comerciantes de sua caravana em particular conheciam todas as rotas mais curtas e eram famosos pela rapidez com que traziam novos produtos ao mercado. Em suma, não se poderia desejar por empregadores melhores.

Apesar da tagarelice de Emery, Alisaie descobriu que estava encantada. Cada aspecto do estilo de vida nômade da comerciante parecia indescritivelmente fascinante. Embora se esforçasse para esconder seu entusiasmo, com o risco de se parecer ignorante sobre os assuntos do mundo, o sorriso na face da comerciante sugeria que a tentativa de fingir desinteresse não teve nenhum sucesso. E assim, após uma pausa como se estivesse pensando na decisão, concordou com a proposta.

Nos dias que se seguiram, Alisaie estudou os hábitos dos mercadores, rapidamente se acostumando com sua rotina, de tal forma que quando a caravana finalmente chegou ao seu próximo porto da escala–uma vila aninhada na base do Sea of Spires–se sentiu uma mulher mudada. Como novos olhos, ela avaliou seu ponto de chegada. O bazar central do povoado era escasso em comparação com os mercados em expansão de Ul’dah, mas o fluxo constante de visitantes que vinham e iam emprestava ao lugar uma espécie de energia agitada.

Embora suas tarefas até então tivessem pedido pouco mais dela do que tirar bandos obstinados de aldgoats da estrada, ela deu um suspiro de alívio quando as carroças entraram em segurança na vila. Eu nunca mais desvalorizo o trabalho de guardas de caravana, ela jurou, sentindo-se totalmente esgotada pelas demandas da vigilância constante.

Por um tempo, Alisaie simplesmente ficou parada e observou enquanto os mercadores corriam de um lado para o outro em uma agitação de preparação. Sua observação silenciosa logo interrompida, entretanto, pela chegada de Emery sem fôlego.

“Há muito mais a ser feito, Senhorita Leveilleur,” a jovem disse. “Precisamos de sua ajuda com as vendas.”

“Vendas? Mas não tenho nenhuma experiência com–”

Pegando sua mão, Emery arrastou Alisaie para as barracas que seus colegas haviam erguido na praça da vila. Residentes e visitantes já se aglomeravam ao redor dos mercadores, inspecionando produtos que se alinhavam ordenadamente nas prateleiras improvisadas.

Alisaie parou quando viu a multidão crescendo. Esta é uma tarefa para o meu irmão, pensou com uma pontada de pânico. Se Alphinaud estivesse aqui, já estaria caminhando para o meio deles, ostentando aquele sorriso infernal. Ainda assim, enquanto ela tentava se afastar, a comerciante a puxou para frente mais uma vez.

“Você se lembra da conversa que tivemos sobre preços, não é?”

“Bem, sim, mas com certeza você não espera que eu–”

Mas Emery já tinha dado as costas e começou a servir um cliente que esperava, deixando Alisaie falando com o vento. Ela ainda estava parada de boca aberta atrás do balcão, entretendo pensamentos de fuga, quando uma matrona de meia-idade empurrou um pedaço de pano em sua direção.

“Quanto por isso aqui?”

Alisaie olhou fixamente para o pano, sua mente em desordem. E então vislumbrou o breve olhar de Emery para trás, e o sorriso malicioso em brincava em seus lábios. Pelo menos uma de nós está gostando disso. O barulho na praça aumentando a medida que as pechinchas começavam para valer e Alisaie se permitiu um suspiro.


Após um dia difícil de barganhas, a caravana vendeu boa parte de seu estoque e, naquela noite, os mercadores se retiraram para uma pousada dilapidada nos arredores da vila propriamente dita. Exausta, Alisaie sentou-se pesadamente em uma das duas camas de seu quarto apertado e começou a folhear o volume sobre teoria arcana que comprou durante sua estadia em Ul’dah. Desde seus dias como estudante, era um ritual noturno para ela abrir um livro antes de dormir e anotar novas descobertas em seu diário. Se ela descobrisse alguma técnica promissora se levantaria cedo na manhã seguinte e tentaria colocar seu aprendizado em prática.

Mas horas de trabalho desconhecido tinham cobrado o seu preço, e passou apenas por mais algumas linhas no capítulo atual quando suas pálpebras começaram a fechar. Quando Emery entrou, já estava praticamente dormindo. A comerciante abafou o riso quando Alisaie agarrou reflexivamente o livro que havia começado a escorregar de seu colo.

“Desculpe por arrastar você para aquilo hoje”, disse Emery, sorrindo. “Pensei que poderia achar divertido.”

“Foi certamente… uma experiência.”, Alisaie respondeu com um sorriso cansado.

Emery se sentou na cama a frente e olhou para o livro com interesse.

“Você nunca perde um dia, não é”, disse ela, balançando a cabeça. “Tentando acompanhar aquele seu irmão?”

“Talvez no início”, Alisaie admitiu. “Mas foi meu avô quem me ensinou o valor da leitura. E é um hábito que tenho orgulho de ter mantido.”

“É bom que você respeite os ensinamentos de seu avô, Alisaie, mas duvido que ele quisesse que dormisse sentada.”, Emery repreendeu gentilmente.

Com isso, ela pegou o volume ainda aberto empoleirado nos joelhos de Alisaie, virou o marcador de seda de volta no lugar e o fechou.

“Eu não tinha acabado…”, conseguiu dizer, enquanto a garota jogava o livro na pilha de seus pertences.

Emery se espreguiçou e bocejou.

“Ainda estará lá amanhã”, disse ela, e então o sorriso travesso voltou. “E não é como se você não tivesse aprendido algumas coisas hoje–fez sua primeira venda, pelo amor dos Doze! Tenho certeza de que tanto Nald’thal e seu avô perdoariam por perder uma única noite de estudo.”

Normalmente, Alisaie não aceitaria desculpas tão convenientes, mas o calor da maneira que Emery falava a desarmou. Havia uma gentileza familiar em suas palavras que acalmou o seu coração.

Ambas as garotas se prepararam para dormir, e Emery iluminou o quarto com outro de seus radiantes sorrisos antes de estender a mão para apagar a lâmpada.

“Durma bem.”

 

E aquela foi a última noite que Alisaie passaria na companhia de sua jovem amiga.


Um tímido raio de sol repousou sobre a face de Alisaie, e ela lentamente abriu seus olhos. Erguendo-se pesadamente para uma posição sentada, passou um momento olhando ao redor antes de se lembrar onde estava—em um dos quartos privados de uma pousada em Gridania. O dia tinha acabado de amanhecer e estava sonhando ainda há pouco.

 

A jornada que fez com Emery havia terminado há muito tempo, suas memórias sendo o único local onde veria a garota novamente. No dia seguinte à estreia de Alisaie como comerciante, a caravana partiu para o seu próximo destino durante uma das raras tempestades de Thanalan. O dilúvio tornou tudo difícil de ver, e ainda mais difícil de dirigir, então as carroças ficaram mais espaçadas que o usual enquanto escorregavam e deslizavam por um caminho lamacento que cortava um penhasco outrora intransitável.

Um estrondo abafado foi o único aviso que tiveram antes que as encostas desabassem. Em uma fração de segundo, as carruagens que vinham na retaguarda e todos que estavam à bordo foram soterrados sob uma montanha de terra encharcada. E Emery se foi.

Como um capricho do destino, Alisaie estava andando na carroça da frente e emergiu da provação sem sequer um arranhão. Ela cumpriu devidamente seu contrato, escoltando os mercadores sobreviventes até a próxima cidade antes de se despedir deles. Com a mente ainda entorpecida pelo o choque, ela estava a certa distância quando por acaso olhou para a caravana e viu que poucas carroças restavam. Seu peito se contraiu com uma dor repentina, e as lágrimas finalmente caíram.

Depois disso, Alisaie voltou a viajar sozinha, arquivando a memória de cada novo encontro em um canto escuro da mente, sem se abrir com ninguém. Foi nos dias solitários que se seguiram que ela ouviu rumores de um grupo desconhecido de heróis que pareciam estar fazendo o trabalho dos Scions. E assim, finalmente, ela encontrou um propósito. Os boatos nos portos davam grande importância aos eventos recentes de Ishgard, mas ela seguiu obstinadamente a trilha de atividade primal. Alisaie aprenderia a natureza desses campeões cujo caminho parecia destinado a cruzar o de seu irmão e companheiros.

Ela balançou as pernas para o lado da cama, espreguiçou-se e abriu as cortinas. Enquanto fitava o céu da manhã, um fragmento do seu sonho surgiu espontaneamente: a imagem do rosto sorridente de Emery. Alisaie lembrou das palavras bem intencionadas da garota com uma tristeza dolorosa.

Algumas coisas não duram até amanhã.



 

Fonte: https://na.finalfantasyxiv.com/lodestone/playguide/#side_storyes
Traduzido por Arius Serph @ Behemoth
Revisado por Yu Kisaragi @ Behemoth

Author: Aro
Idealista que se empolga com música, comida, pescaria, trocadilho, boas histórias, filosofia, animais, café, pessoas animadas e... na verdade, eu me empolgo fácil mesmo.

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