FFXIV | Contos da Tempestade: Quando a Aposta Vale a Pena

Tales from the Storm: When the Wager Pays Off

Contos da Tempestade: Quando a Aposta Vale a Pena

Carregada pelos ventos gélidos, a voz estridente de um soldado distante flutuou através de Lochs.

“Oh, esta caixa irá virar um cofre quando a aposta valer a pena,”

“Ou esta caixa irá virar um caixão quando esta aposta perder… ”

Pipin conhecia bem a música, assim como todas as pessoas de Ul’dah acima de uma certa idade. Contava a história de um jovem a caminho de buscar sua fortuna na cidade dourada, tendo apenas uma caixa como companhia. Sua perigosa jornada pelas terras selvagens era retratada como uma jogada de dados animada, um convite a Nald’Thal para encher sua pesada caixa com ouro, ou, na falta disso, seus restos mortais.

O marechal sempre duvidou que o herói da história tivesse ganhado a aposta, em grande parte porque a música era uma das favoritas de seu pai, e ele não conseguia imaginar o homem sem se preparar para algum desastre iminente.

Em um forte contraste com seu pai adotivo, o pai biológico de Pipin era um fracasso abjeto—um apostador inveterado e um bêbado que preferia vender seu próprio filho a pagar uma dívida com seu próprio suor. Um homem que tinha, de fato, feito exatamente isso. Pipin tinha doze anos na época, atarefado separando pedras na mina quando foi abordado por um treinador musculoso.

“Venha, garoto—você pertence a mim agora! E as areias de sangue estão sempre sedentas!”

E antes que ele percebesse o que estava acontecendo, o jovem lalafell se viu esparramado no chão de uma cela de pedra apertada nos estábulos dos gladiadores. Dias de labuta incessante se seguiriam. Todas as manhãs, ele era acordado ao raiar do dia para realizar tarefas para os lutadores mais velhos. E quando esses deveres fossem cumpridos, ele poderia esperar por mais horas no pátio de treinamento sob o olhar do impiedoso mestre de exercícios, o menor dos erros corrigido pelo estalar de um chicote ou o baque de um cacete.

A única coisa que Pipin não odiava em sua nova vida era a comida. O corpo de um gladiador era um investimento, e o treinador queria que seus pupilos estivessem em forma e fortes para levar para casa sua parte do prêmio em dinheiro. Até os novatos recebiam refeições fartas: grandes fatias de pão e pedaços de carne do tamanho de um punho nadando em caldo. Melhor ainda, o cozinheiro era liberal no uso de especiarias, dando ao Pipin um mundo de sabores que ele nem sabia que existia.

Mas além deste singular prazer, a dor de cada dia que passava parecia cada vez mais difícil de suportar. Pipin não tinha certeza de quanto tempo conseguiria suportar a rotina exaustiva e, mesmo que conseguisse, não havia garantia de que sobreviveria à primeira partida nas areias.

Não sou nada mais que um escravo.

Desesperado para escapar, Pipin observou e esperou uma chance de fugir, mas o mestre de exercícios não parecia baixar a guarda nem uma vez. Parecia que não havia outro destino a não ser uma sepultura. Então, após um ano de trabalho árduo e treinamento que quebrava ossos, ele foi ordenado a servir como atendente dos estábulos de um dos campões. Foi um encontro que mudaria a vida de Pipin para sempre, embora dificilmente parecesse importante na época…

 

“Quantos anos você tem, rapaz?”

“Treze.”

O gladiador parecia satisfeito com a resposta de Pipin, e não fez mais nenhum esforço para engajar uma conversa com ele durante a caminhada até uma das antecâmaras do Coliseu. Sem saber se o robusto Highlander estava nervoso antes de sua partida ou apenas um homem de poucas palavras, o garoto decidiu segurar a língua. Gladiadores podiam ser muito mal-humorados, e Pipin não queria ganhar um tapa na orelha por acabar a concentração dele.

Mesmo depois de chegar na antecâmara, o Highlander não disse nada, exceto algumas instruções concisas. Pipin as cumpriu sem palavras, ajudando a prender a armadura ao gladiador, antes de finalmente oferecer seu elmo; uma peça estilizada para se assemelhar à cabeça com chifres de um touro. O imponente Hyur arrancou-o de suas mãos como se não pesasse nada, vestiu-o e caminhou para a arena.

“Meus senhores, damas e cavalheiros—eu lhes apresento Raubahn Aldynn, o Touro de Ala Mhigo!”

A voz retumbante do arauto do Coliseu foi respondida por um rugido estrondoso que sacudiu as paredes da antecâmara. Pipin ficou pasmo. Este “Touro de Ala Mhigo” teve que apenas pisar na areia para levar os espectadores ao frenesi.

Nos meses que se seguiram, Pipin muitas vezes se viu atuando como atendente de Raubahn. Embora o gladiador fosse reticente no início, suas trocas empoladas gradualmente se tornaram mais longas, e o par passou a compartilhar detalhes de seu passado. O Highlander falou de nascimento na terra de Ala Mhigo, e das batalhas que lutou—da rebelião de seu povo contra um rei tirano, e da subsequente invasão do Império Garlean. Ele contou como havia fugido de sua terra, desesperado e ferido. De como ele cambaleou pelas terras selvagens até chegar à cidade de Ul’dah, onde foi preso por suspeita de espionagem,  E agora aqui estava ele: um campeão do Coliseu, lutando por sua liberdade diante uma multidão que gritava o seu nome.

Parecia inexplicável para Pipin que um homem com a força e o carisma de Raubahn tivesse sido forçado à vida brutal de um gladiador. Mas o pensamento não lhe trouxe desespero. Pelo contrário, foi incentivado pela a ideia de que um escravo das areias sangrentas poderia ganhar bolsas suficientes para comprar sua própria emancipação—que ele poderia ser mestre de seu próprio destino.

Se meu companheiro escravo pode comprar sua liberdade, então por que não eu?

Seu propósito claro enfim, Pipin comparecia ao treinamento com uma nova determinação. Ele sobreviveria. Ele seria livre.


“Aqui está! Eu tenho o pagamento final em minhas mãos!”

A expressão de triunfo no rosto de Raubahn enquanto voltava para a antecâmara perduraria por muito tempo na memória de Pipin. O Highlander parecia mais feliz do que depois de todas as suas vitórias anteriores combinadas. E não era para menos…

“Nunca um prêmio foi tão merecido!” Pipin exclamou, radiante.

Ele nunca mais vai precisar pisar nas areias sangrentas de novo. O mero pensamento o deixou tonto. Mas naquele mesmo momento veio o choque—a certeza que o homem que havia transformado sua percepção, o mentor cujos passos desejava seguir, logo iria embora.

“Por que está franzindo a testa, rapaz?” Raubahn perguntou, confuso. “Você está livre.”

Agora era a vez de Pipin parecer confuso. Eles congelaram por um momento em um quadro estranho: um gladiador corpulento segurando uma bolsa de prêmios volumosa olhando consternado para um jovem Lalafell igualmente intrigado.

“Estou dizendo que você não precisa mais arriscar sua vida,” continuou Raubahn, uma pitada de exasperação em sua voz. “A maioria dos gladiadores jovens nunca chega a envelhecer. Coloque um contra o outro, e ambos podem acabar mortos. Eu o pouparei deste destino.”

A ficha finalmente caiu. Ao longo dos meses desde seu primeiro encontro, o Highlander não estava guardando seus ganhos para o preço de sua própria liberdade. Ele esteve pagando a dívida do meu pai. Os olhos de Pipin se encheram de lágrimas enquanto medo e exaustão—seus companheiros constantes por mais de um ano—foram varridos por ondas de alívio e gratidão. Ele não trabalharia mais para o treinador.

 

Na manhã seguinte, Pipin estava sozinho nos portões dos estábulos dos gladiadores, seus escassos pertences reunidos em um pequeno saco de estopa. Raubahn não podia sair de sua cela, e parecia que nem o treinador nem o mestre de exercícios se importavam muito com um jovem em cujo futuro não tinham mais investimentos.

Pipin seguiu para a rua. O sol do deserto mal havia aparecido no horizonte, e os paralelepípedos estavam frios sob seus pés. Livre. Ele deu três passos deliberados, saboreando sua libertação inesperada, e então seguiu em um passeio. Mas a cada passo ao longo da via vazia, se tornava cada vez mais consciente da dúvida incômoda em seu estomago. E se o pai apostar tudo em outra causa perdida? Seu pai encharcado de vinho já havia mostrado a disposição de vender seu único filho—não havia nada o impedindo de fazer mais uma vez. Nunca mais. Pipin parou abruptamente, deu meia-volta e voltou por onde tinha vindo.

“Pipin, rapaz? Achei que você já teria ido embora há tempos agora.”

Raubahn inclinou a cabeça quando a pequena figura na porta de sua cela respirou fundo.

“Desejo continuar meu treinamento como gladiador,” declarou Pipin, sua voz clara e inabalável. “Sou grato por tudo que você fez por mim, mas nunca serei verdadeiramente livre até que tenha forças para me libertar eu mesmo.”

Pipin explicou devidamente como seu pai poderia muito bem o vender como um bem mais uma vez, e que ele preferia ser o mestre de seu próprio destino, por mais brutal que fosse, e aprender aos pés de um homem que ele realmente respeitava, a ter de viver com medo. Raubahn deu sua resposta com um sorriso feroz.

Embora conhecesse bem a generosidade do homem, Pipin ficou surpreso com o que o gladiador fez em seguida. Descobriu-se que o pai de Pipin havia assinado um contrato ao entregar o filho ao treinador, transferindo todos os seus direitos e obrigações como guardião legal do menino. Usando seu prêmio em dinheiro, Raubahn comprou este documento do ex-proprietário de Pipin e invocou a cláusula de guarda, iniciando assim o processo formal de adoção.

Nos anos que se seguiram, o par viveu junto, como pai preso e filho emancipado. Uma situação curiosa, sem dúvida, mas que permitiu a Pipin retomar seu estudo da lâmina sob a tutela decididamente menos insensível de Raubahn. Porém, apesar dos protestos de Pipin, seu pai adotivo não permitiu que lutasse nas areias. Raubahn jurou, no entanto, que poderia escolher o seu próprio caminho quando atingisse a maioridade.

 

Agora com vinte e cinco anos, experiente em lutas graças ao período como mercenário, Pipin era um oficial dos Immortal Flames, lutando para recuperar a amada pátria de Raubahn.

“Você arriscou muito e mais um pouco para me ver prosperar, pai”, disse Pipin desembainhando a lâmina pesada de Tizona. “E eu farei com que sua aposta valha a pena!”



 

Fonte: https://na.finalfantasyxiv.com/lodestone/special/tales_from_the_storm/sidestory_03/#sidestory_03
Traduzido por Arius Serph @ Behemoth
Revisado por Yu Kisaragi @ Behemoth

Author: Aro
Idealista que se empolga com música, comida, pescaria, trocadilho, boas histórias, filosofia, animais, café, pessoas animadas e... na verdade, eu me empolgo fácil mesmo.

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