FFXIV | Contos da Dragonsong War: Aquilo que perdura de um cavaleiro

Tales from the Dragonsong War: What Remains of a Knight
Contos da Dragonsong War: Aquilo que perdura de um cavaleiro

Sir Vaindreau de Rouchemande, o Reverendíssimo Arquimandrita de Heavens’s Ward, era um homem atormentado pela dúvida.

Já bem presente em sua sétima década, seu corpo há muito havia começado a protestar diariamente contra as demandas físicas do escritório. Mesmo assim, não era a dor constante nos joelhos nem a pontada nas costas que incomodava o cavaleiro, mas a fé no homem que jurou proteger. Pela primeira vez em mais de quarenta anos de serviço, Sir Vaindreau questionou a retidão do arcebispo.

Tudo havia começado um mês antes, em uma manhã como outra qualquer. Ele estava de guarda na entrada do pátio interno do Vault, um refúgio de tranquilidade onde Sua Eminência o Arcebispo Thordan VII costumava meditar em solidão. O guerreiro ancião havia mantido muitas dessas vigílias enquanto o arcebispo se comunicava silenciosamente com o divino, e logo foi surpreendido quando ouviu os murmúrios fracos de uma conversa jardim adentro.

Orando em voz alta, Sir Vaindreau raciocinou. Mas ao som de uma voz distintamente diferente, a mão foi de encontro ao punho de sua espada. Apenas o medo de que tivesse ouvido mal o impediu de avançar pelo o pátio. Amaldiçoando tanto sua sua audição deficiente quanto o orgulho teimoso, optou por proceder o quão silenciosamente possível para sua armadura barulhenta.

Esticando o pescoço para ver além das trepadeiras florescendo, buscou por algum intruso e quase perdeu o equilíbrio quando avistou seu mestre em uma conferência silenciosa com um homem de vestes pretas.

Um Paragon.


Primeiro Inquisidor Charibert Leusignac nunca foi um homem paciente. Embora sua vocação fosse divina, ele não pôde evitar amaldiçoar a escassez de hereges para praticar sua arte. A entrada não anunciada de seu aprendiz mais incompetente não ajudou na melhoria do humor. O menino começou a se arrastar para dentro, seu corpo em aparente desacordo com seus pés, lançando olhares nervosos ao redor da câmara enquanto procedia. Finalmente, depois de fixar o olhar em algum lugar abaixo do queixo de Charibert, cuidadosamente ofereceu um envelope.

“E isso seria?”

Tirando a missiva da mão trêmula do noviço, Charibert notou que nem o pergaminho nem a cera sem características proeminentes que o selava traziam qualquer indicação quanto à identidade do remetente.

“Um homem em vestes pretas me deu. Não ofereceu nome algum…”

E você não pensou em perguntar, observou silenciosamente, lábios se curvando enquanto imaginava como puniria o menino. Ainda olhando pra ele, Charibert estendeu o dedo indicador em direção ao selo e conjurou uma minúscula língua de fogo, derretendo a cera, mas deixando o pergaminho intacto; um lembrete de sua habilidade como piromante –e torturador– não perdido em seu aprendiz.

Quando o calor fez seu trabalho, puxou a carta com um floreio, sua expressão severa gradualmente dando lugar a uma de alegria profana enquanto seus olhos dançavam para frente e para trás pela página. Um chamado divino de fato.


Olhando para Ishgard das ameias mais altas do Vault, Sir Vaindreau mal sentiu a pinicação gelada do ar noturno em sua bochecha. Pelo o que pareceu a centésima vez, ele se perguntou o que significava ser um cavaleiro de Heavens’ Ward… apenas para a resposta mecânica soar como de costume.

Somos os campeões do Holy See. Personificamos as virtudes dos doze cavaleiros que lutaram ao lado do Rei Thordan contra o terrível Nidhogg. Somos os guardiões escolhidos do arcebispo, vigilantes da fé verdadeira. O escudo e a lança da própria Fúria…

Mas o credo nada dizia de um arcebispo que consorcia com os servos do caos! Ele tinha ouvido o homem discutindo os pontos mais delicados de um ritual de invocação – intencionado não à Halone, mas a outro. E embora a natureza exata dessa blasfema divindade não lhe fosse conhecida, sabia que até mesmo contemplar tal ato violava a lei mais sacrossanta da Igreja.

Não havia mais nada a fazer: iria confrontar o arcebispo com a verdade do que havia testemunhado. E por mais que ele mesmo fosse condenado por heresia, não deixaria de responsabilizar Thordan.

Virando as costas para a cidade adormecida e seu último resquício de dúvida, Sir Vaindreau desceu às profundezas desertas do Vault, logo chegando às portas da residência papal, onde Sir Hermenost estava de vigia.

“Devo falar com Sua Eminência sobre um assunto de suma importância.”
“A hora é tardia, Arquimandrita. Que notícias terríveis são essas que não podem esperar até–”

Sir Vaindreau silenciou o homem mais novo com um gesto de mão, indicando sua indisposição em falar algo mais com um simples aceno de cabeça. E embora a entrada fosse estritamente proibida a todos, Sir Hermenost ficou de lado–pois tal pessoa não era um intruso, mas o arquimandrita de Heavens’ Ward. Fechando as portas atrás de si, o velho cavaleiro soltou um suspiro de alívio silencioso e, após uma pausa para clarear seus pensamentos, prosseguiu ao silêncio do saguão de entrada. Ao se aproximar da porta sombria, no entanto, seus olhos distinguiram a forma de uma figura encapuzada.

“Quem está aí?!”

Embora tenha rugido o superficial desafio, cada fibra sua gritava a resposta –o Ascian!– e se aproximou do fantasma oculto, mal consciente de ter desembainhado sua espada.

“É bem passada da sua hora de dormir, senhor cavaleiro. Para onde se diriges tu com tamanha avidez?”

A figura jogou para trás seu capuz, revelando feições divididas por um sorriso torto. Marcando o cabelo fortemente amarrado para trás e o olhar predatório do homem, Sir Vaindreau precisou apenas de um momento para identificar o intruso.

“Eu farei as perguntas, Primeiro Inquisidor. Seu escritório não permite tal invasão!”

Apesar de aliviado por não ser nenhum Paragon à sua frente, Sir Vaindreau não relaxou a empunhadura de sua arma. Charibert era um homem de reputação sinistra, e o cavaleiro instintivamente calculou a distância que precisaria cobrir para colocar o mago sorridente ao alcance da espada.

“Você me conhece, Arquimandrita? Estou honrado!” Charibert respondeu, seu tom untuoso provocando um retraimento de desgosto em Vaindreau. “Quanto a questão da minha ‘invasão’, ora, isso é facilmente explicado”, continuou. “A inquisição recebeu certa informação de que um herege tentaria passar por este mesmo salão nesta mesma noite, e assim me foi concedida permissão para ficar à espera.”

Com tal revelação, a expressão severa de Sir Vaindreau ficou ainda mais sombria.

“Você insinua que eu sou suspeito?”

O cavaleiro não sabia como suas ações foram previstas, mas só poderia haver uma razão para o homem a quem serviu fielmente por quatro décadas convidar uma víbora para sua casa: o arcebispo o desejava morto.

Embora sua mente cansada vacilasse com a revelação, Sir Vaindreau era um dos melhores guerreiros de Ishgard. Quando as chamas vieram, ele já estava se jogando para longe do calor escaldante. Rolou para ficar de pé com estrépito e avançou com o escudo erguido.

Charibert, um mago de guerra experiente também, estalou a língua em um sinal de aborrecimento e calmamente entoou outro feitiço.

“Queime, herético!”

Uma esfera de fogo emanou da ponta do cajado ornamentado do inquisidor e explodiu contra o escudo de Vaindreau. Com reflexos aprimorados por uma vida inteira lutando contra dragões, o veterano jogou para o lado o pedaço de metal que se derretia rapidamente e atacou com sua lâmina em um movimento fluído.

“Hmph. Apesar de todos os rangidos, você faz orgulho a sua Ordem, meu velho.” Embora um salto para trás em tempo hábil tenha salvado seu olho, Charibert sangrou muito a partir de corte agora em sua bochecha direita.

“Você pensa em derrotar um cavaleiro de Heavens’ Ward com essas chamas ínfimas?!” Vaindreau se enfureceu. “Uma morte limpa pode ser sua intenção, mas você poupa as pedras do escurecimento por sua própria conta e risco!”

O inquisidor estava realmente se contendo, pretendendo ferver o guerreiro idoso dentro de sua armadura sem deixar uma marca no mármore. E agora parecia que seu erro de cálculo provaria ser sua queda – o último ataque o havia deixado com as costas contra a parede. Não teria tempo para longos encantamentos. No entanto, embora todas as vantagens estivessem com o seu oponente, não pôde deixar de sorrir.

“Como é maravilhoso lutar contra um lobo depois de tantas ovelhas,” ronronou Charibert. “Irei lembrar de você com carinho, Sir Vaindreau.”


Na manhã seguinte, um pouco mais cedo do que de costume, Sua Eminência Thordan VII saiu de seus aposentos. Para além do saguão de entrada, um insone Sir Hermenost ainda permanecia em seu posto, enquanto SIr Vellguine de Bourbagne esperava pacientemente para acompanhar o arcebispo à missa matinal.

“Sir Vaindreau veio até mim ontem à noite para anunciar sua aposentadoria,” anunciou Thordan em voz tranquila.

“Perdão, Vossa Eminência? Ele não disse nada sobre–O arquimandrita renunciou?”

O arcebispo assentiu pesadamente. “Como um homem que passou da flor da idade, confessou que os fardos do serviço de cavaleiro começaram a cobrar seu preço. Conversamos longamente sobre isso e muitas outras coisas até as primeiras horas da manhã…” Thordan olhou para trás em direção a sua residência. “Sir Vaindreau agora descansa na antecâmara, e eu não gostaria que fosse perturbado. Nós, velhos, precisamos do nosso sono.”

Emoções guerreavam nos rostos de Sir Hermenost e Sir Vellguine enquanto contemplavam como tal decisão deveria ter doído a seu piedoso comandante. De todos os cavaleiros vivos, Sir Vaindreau havia sido o defensor mais ferrenho de Heavens’ Ward e seu dever sagrado. Mas o que estava feito estava feito. Deixando o companheiro com o seu merecido descanso, os dois cavaleiros tomaram seus lugares ao lado do arcebispo e partiram rumo a catedral.

Alguns dias depois, o Holy See anunciou oficialmente a aposentadoria de Sir Vaindreau de Rouchemande de Heavens’ Ward e apresentou Sir Zephirin de Valhourdin como o novo arquimandrita da ordem. Abordando a ausência conspícua se Sir Vaindreau na cerimônia de unção, o arcebispo explicou que o cavaleiro havia implorado pela permissão para partir em peregrinação–um desejo final por paz e solidão que a Igreja dificilmente poderia negar.

E assim Heavens’ Ward perdeu seu último verdadeiro campeão, sua passagem marcada por pouco mais do que uma leve queimadura que ainda mancha as pedras frias do piso do saguão de entrada da residência papal.



Fonnte: https://na.finalfantasyxiv.com/lodestone/special/2016/short_stories/#sidestory_05
Traduzido por Arius Serph @ Behemoth
Revisado por Yu Kisaragi @ Behemoth

Author: Aro
Idealista que se empolga com música, comida, pescaria, trocadilho, boas histórias, filosofia, animais, café, pessoas animadas e... na verdade, eu me empolgo fácil mesmo.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *