Bloodborne | Review

“A emoção mais antiga e mais forte da humanidade é o medo, e o tipo de medo mais antigo e mais forte é o medo do desconhecido” – H.P. Lovecraft

Saudações de chegada. Uma cidade em chamas, feras à solta, uma noite sem fim aparente, os gritos ecoados por um céu carmesim e sangue, muito sangue. Caçadores e caçadoras, bem-vindos à Bloodborne.

A FromSoftware é uma empresa agora conhecida, e reconhecida, pela maneira única de criar gameplays desafiadoras e contar uma história. Carregando este selo de qualidade, temos um título de 2015 nunca esquecido pela sua base de jogadores pela temática e entrega ímpar em meio a outros jogos.

Recentemente tivemos a estreia do quadro “Conhecendo Jogos Novos” no canal da Moogle’s Cave e por um capricho do destino, além de uma campanha acirrada por votos, Bloodborne foi o escolhido para iniciar a lista. A stream você pode acompanhar aqui.

Sendo esta a razão, aquele que carrega a própria Marca dos Caçadores em seu braço direito vem escrever esta review 8 anos após seu lançamento na esperança de novos caçadores se juntarem a Caçada.

Como se pudesse sentir o fim dos tempos chegando lentamente em cada fibra do seu corpo. E mesmo assim não ver nada.

História

O que aparenta começar como apenas uma caçada às feras que rondam Yharnam nada mais é o chamariz para um plot envolvendo a ganância, ou ignorância, do homem e o plano de Deuses Antigos que vieram buscar seu pagamento ou possuem sua própria agenda. Infelizmente, é durante a mais longa das noites que o protagonista chega.

O jogo não conta explicitamente detalhes do que aconteceu e interações com NPCs são escarsas, abrindo a possibilidade do jogador derrotar o último chefe e mesmo assim não entender dos terrores que acabara de passar ou evitar.

Crítica de uns, esta situação também pode ser interpretada pelas lentes do contexto de Yharnam, um estrangeiro recém-chegado em uma cidade amendrontada e à beira da autodestruição descobre pela exploração e análise do que encontra (itens) pistas do ocorrido, montando o quebra-cabeças do terror cósmico. Além de que combina com a ideia de que a ameaça está naquilo que não se percebe em nossa realidade, não está à vista.

Finalmente, portando mais de um final, cativa por meio de breves interações e conversas com os raros NPCs presentes na jornada.

(Aqui percebemos que Yoshi-P é um homem de cultura.)

Gameplay

Sendo precedido por Demon’s Souls e Dark Souls I/II, a gameplay de Bloodborne é fundamentalmente diferente na velocidade e estilo em que os combates ocorrem, dada a janela de tempo em que o jogador pode recuperar o HP perdido se causar dano ao oponente.

Esta simples característica incentiva o combate corpo-a-corpo de modo a recompensar a maestria presente no raciocínio rápido. Além disso, as trick weapon ao possuírem duas versões para uso adicionam uma camada de dinamismo não apenas em quantidade de dano causado como também de que maneira aproximar seus adversários.

(Nada dá uma sensação de poder maior do que ir em direção à uma besta e trocar o modo da sua arma. "Comece a rezar.")

Outros elementos mais clássicos retornam como o vial de sangue (um “estus flask”), mas no lugar de um escudo, temos uma arma de fogo, não servindo para dano em si, mas para possibilitar a mecânica de parry/stun ao ser utilizada no tempo certo durante o golpe inimigo.

E claro, a possibilidade de terminar o jogo com a mesma arma que começou através de upgrades paulatinos é algo bem interessante, quase como um vínculo à arma e que afeta a gameplay.

Por fim, para além das dungeons geradas randomicamente, Chalice Dungeons, um ponto crucial na história e gameplay é o Insight (discernimento/conhecimento), pois quanto mais o caçador é exposto aos horrores do sangue antigo, mais passa a ver coisas que não estavam ali antes. Monstros mudando de forma, dano de frenesi maior. A cada luta que se entende mais sobre o mundo, mais a loucura cria raízes na mente.

A para-consciência, pois não poderia ser uma consciência completa, dos acontecimentos leva o caçador e jogador a uma espiral sangrenta de conhecimento proibido.

Música e aspectos visuais

A ambientação é outro fator que distingue o título de qualquer outro título da FromSoftware. Na época Vitoriana ocorreu um renascimento da temática Gótica e podemos dizer que o jogo demonstra pela arquitetura e vestimentas tal informação. A noite pode ser sangrenta, mas estilosamente sangrenta. Além disso, as entidades de outra realidade marcam presença do jeito em que só elas poderiam aparecer.

É de se notar primariamente que o único momento em que músicas de fato aparecem é durante o encontro com os chefões, porém, o nosso andar, os lamentos das bestas ou murmurinho dos habitantes presos em casa nos acompanham, dando significado ao vazio: “é você por você mesmo, ninguém vai vir ao seu resgate”. Esse contraste do toque de realidade em meio às loucuras presenciadas causa certa inquietação digna da temática.

Outra consequência direta é a potencialização das músicas. O jogador acaba por sentir muito mais porque além da barra de HP em tela, agora existe algo a mais no seu ouvido, algo que não estava lá, algo que lhe diz que esta é uma guerra que não pode vencer, que qualquer que seja a coisa à sua frente, está além da compreensão humana. E que mesmo assim, você deve lutar.

Por vezes a própria manifestação do desespero ensandecido em forma de música, dito resultado é alcançado através do uso de notas atonais (ex: como utilizar uma paleta certa de cores e por vezes usar algo fora daquilo). Por mais que não se saiba de forma consciente, o cerébro humano capta o padrão da melodia e esses pontos fora causam certo desconforto ou distúrbio. Aliando-se ao coral, que chega a notas incrivelmente altas beirando o limite da própria voz humana, tudo diz ao mesmo “você nunca entenderá, lute, mas nunca entenderá.” Cada nota representando perigo, morte e loucura.

A união do clássico, ritmo acelerado e esses elementos fazem da trilha sonora algo assombradamente sem igual.

Meu Insight subindo um ao terminar o vídeo.

Considerações finais

Bloodborne é uma experiência tão única que não há de se dizer “se gostou desse, vai curtir A ou B”, razão pela qual ele ainda é tão falado hoje em dia, quase uma década depois contendo um limite de 30fps.

Da percepção como o  mundo muda ao seu redor ao seu propósito, tendo o ritmo do combate acompanhando a música ambientados em torno de uma única temática gótica-vitoriana é fenomenal.

Influência tal da música é que em dada transição de fase de um chefão algo interessante ocorreu. Enquanto ele recobrava a consciência humana em sua forma bestial, eu caía no instinto feral de que agora tinha a chance de derrotar uma lenda. A trilha sonora que embalou no momento seguinte deu luz à valsa mortal e sangrenta enquanto dançavámos até apenas um ficar de pé em meio a pilhas de cadáveres e uma piscina de sangue. Quem era a besta e quem era o humano naquele momento, não saberia dizer.

Se você é fã do gênero Souls, dê uma chance. Se você é fã de horror cósmico, dê uma chance. Se você gosta de boa música, dê uma chance. De forma geral, dê uma chance de conhecer a obra-prima que mantém o requinte em meio a mares de sangue.

Assim sendo, adeus, bom caçador, que você encontre o seu valor no mundo desperto.

Author: Aro
Idealista que se empolga com música, comida, pescaria, trocadilho, boas histórias, filosofia, animais, café, pessoas animadas e... na verdade, eu me empolgo fácil mesmo.

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